Outra vez sentado no sofá, passando o milésimo serão
sozinho, olhando para o abstracto, em completo silêncio, lá estava Rafael em
seu mundo seguro e fadistioso. Seria aquela uma noite normal como as outras,
estariam os seus pensamentos a gozar da mesma calmaria que o seu corpo? Estaria
ele em paz com os seus instintos? Nada o denunciou durante a primeira hora que
ali esteve. Porém quando menos esperava, como se tivesse sido possuído por
alguma força superior, levantou-se e pegou na lista telefónica, desesperado por
encontrar o número de telefone de uma certa moradora da cidade de Luanda.
Contudo após longos trinta minutos de busca pelas páginas douradas não obteve
grande sucesso e desistiu, achando ridícula e de certo modo desesperadora a sua
atitude.
Determinado a esquecer aquele assunto, ligou a televisão
e procurou imediatamente por uma distração. Vagueiou lentamente por toda a
grelha de cais televisivos mas nenhum o deteve, tudo lhe parecia ser pouco
cativante ou interessante, estava inquieto e sabia bem o porquê. Não a
conseguia tirar da cabeça, por mais que tentasse continuava a vê-la nitidamente
em seus pensamentos e achava-se aflito por esse motivo. Nunca havia sentido
nada parecido, por mulher nunhuma. Não estava habituado a sensação e não
suportava o facto de não a poder controlar.
Quando menos esperava, levantou-se abruptamente,
caminhando até a porta, desejando sentir-se melhor fora de casa, como se aquela
situação não o pudesse acompanhar até a rua. Percorreu por vários quarteirões a
pé, procurando inconscientemente por traços dela em todos os rostos que
encontrou. Mesmo nos mais incompatíveis e menos semelhantes. Passado algum
tempo, deu por si, sentado outra vez, mas desta vez num banco de pedra na
Marginal de Luanda, ignorando a exuberância das luzes da Baía reflectidas sobre
o mar, o brilho mágico da lua e o encanto das estrelas para se concentrar no
vazio, de cara voltada para o chão, com as mãos nas bochechas, sustentando o
peso de sua cabeça. Anseiava desesperadamente por alguma resposta mas quanto
mais pensasse sobre o assunto mais encurralado se sentia.
Era Sexta-feira e sabia que só voltaria a falar com
ela na terça-feira que era o dia em que se previa que o reparo do carro ficasse
pronto. Normalmente era a recepccionista a informar aos proprietários para que
fossem levantar os veículos a determinada oficina mas desta vez queria ser ele
a fazé-lo, pois receiava que aquela fosse a última vez que teria oportunidade.
E o pior é que teria de passar o resto do fim-de-semana naquela angústia.
Manteve-se ali parado durante cerca de uma hora e depois sem se que lhe
restassem mais alternativas regressou a casa, refugiou-se num banho quente e
depois de quase duas horas debatendo-se em dúvidas e contradições, finalmente
conseguiu adormecer.
Na manhã seguinte levantou-se um pouco mais tarde do
que era costume mas ainda assim, para seu espanto, soube-lhe a pouco e desejava
ter ficado mais tempo na cama. Porém era dia de compras e apesar de um pouco
desorientado estava consciente de que precisava ir. Após ter esfregado os olhos
e esticado os braços, fez subir as perceanas do quarto para que os raios de sol
iluminassem e aquecessem. De seguida calçou uns chinelos de borracha, deambulou
até a casa de banho para escovar os dentes, fazer a barba e tomar rapidamente
um duche. Após se ter vestido casualmente, colocando a primeira t-shirt que
encontrara na cómoda conjulgando com as suas favoritas bermudas brancas, calçou
umas sandálias de cabedal e dirigiu-se a cozinha lentamente, arrastando os pés,
desejando loucamente beber uma chávena de café forte com leite e canela e comer
ovos mechidos com queijo e torradas.
Faltando pouco para as onze horas da manhã já estava
ele a caminho do super mercado, calmo e ilusoriamente animado pois
aparentemente não teria tempo para pensar nela visto que teria um dia agitado.
Portanto, mal podia ele prever o tamanho da agitação que o resto do dia o
reservava...
Gostei do trecho. pelos vistos é uma narrativa.deves ter cuidado com a intervenção do narrador na história. boa escrita
ResponderEliminarOlá obrigada! Prometo levar isso em conta! Bem visto! Beijos!
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